sexta-feira, 16 de março de 2018

TABELA DA ANATOMIA HUMANA ESPIRITUAL

16.1 - TABELA DA ANATOMIA HUMANA ESPIRITUAL
PLANOS
ORIENTAL
Esoterismo em Geral
Rosacruz
André Luiz
Allan Kardec
P.D.
Atman
Atmã-Budhi
Jiva
Corpo Divino
Corpo Nirvânico
Corpo Intimo
Mônada
Espírito Puro
Santo Cristo
Espírito
(8) Espírito

 P.B.
Buddhi
Anandamayakosha
Corpo Búdico
Corpo Cósmico
Alma Espiritual
Alma Divina
(7) Eu sou (EGO)
 P.M.
Buddhi-Manas
Manas Superior
Corpo fio-ego
Corpo Kármico
Mental Superior
Corpo Causal
Ser Integral
(6) Corpo Causal
(5) Mental

(4) Perispírito
 P.M.
Kama-Manas
Manas Inferior
Corpo Mental
Mental Inferior
Corpo Mental
Ser Mental
Mente
 P.A.
Kama-Rupa
Corpo Astral
Corpo Astral
Corpo Sutil
Corpo Astral
Ser Natural
Corpo dos Desejos
Psicossoma
Perispírito
...
Prâna
Vitalidade
Vitalidade
Perietérico
Vitalidade
Energia Vital
(3) Fluído Vital
ou Principio Vital
 P.E.
Linga Sharira
Duplo Etérico
Duplo Etérico
Corpo Etérico
Corpo Vital
(2) Biossoma
Duplo  Etérico
 P.F.
Sthula Sharina
Corpo Físico
Matéria
Corpo Físico
Corpo Bruto
Físico
Ser Material
Corpo Denso
Corpo Carnal
SOMA
(1) Corpo Físico
OBSERVAÇÕES:
AURA HUMANANão faz parte da anatomia dos  corpos e sim MANIFESTAÇÃO semi-material, emocional e mental dos mesmos.
Onde Allan Kardec escreve FLUÍDO, em alguns casos, este termo refere-se a ENERGIA ESPIRITUAL o bom senso do leitor, para ao ler obras espiritualistas, faça essa observação interpretativa.
 
( 8 )
PLANO ÁTMICO - PLANO DIVINO (PD):
Espírito puro sem corpos , essência divina. Espírito Essência, Centelha Divina,   Mônada, Semente pulsante de vida, inconsciente Puro, Eu Cósmico.
( 7  )
PLANO BÚDICO (PB):
Budhi, Corpo Búdico, Alma Espiritual, Alma Divina, Eu sou (EGO).
( 6 )
PLANO MENTAL SUPERIOR (PM) (3 SUB-PLANOS):
 Buddhi-Manas, Nirvânico, Mental Superior, Corpo Causal, Ser Integral.
( 5 )
PLANO MENTAL INFERIOR(PM) (4 SUB-PLANOS):
 Kamas-Manas, Mental Inferior, Corpo Mental, Ser Mental, mente.
( 4 )
PLANO ASTRAL (PA) (7 DIMENSÕES):
Corpo Astral . Cópia celular deo corpo físico. Estruturas Corpóreas com Consciência.Veículos de manifestação do espírito. Supradimensões (vibrações médias e altas) e infradimensões (vibrações densas e baixas - Umbral).
( 3 )
PRANA:
Combustível, energia vital que alimenta o corpo físico, na medida que passa os anos essa energia vai terminando.  A energia Vital (perietérico ou Prana)  interpenetra o duplo etérico que é mais denso e é parte externa deste. O duplo etérico é o veículo condutor da energia vital ( o ser humana nasce com um quantum vital dessa energia e quando ela acaba ele deixa de existir fisicamente).
( 2 )
PLANO ETÉRICO (PE)- SEMI-FÍSICO:
Elo de ligação, energia semi-material , veículo responsável pelo vitalidade do corpo físico, transmutando a energia para manter energeticamente toda a estrutura funcionando. Possui quatro camadas, da mais densa dentro da derme, vai se sutilizando até penetrar no plano astral. Algumas doutrinas misturam DUPLO ETÉRICO com PERIETÉRICO (Fluído Vital), mas o DUPLO ETÉRICO é o VEÍCULO que conduz a a ENERGIA ELÉTROMAGNÉTICA que dá energia para manutenção ativa (animação) do corpo físico e dos órgãos físicos.
( 1 )
PLANO FÍSICO (PF):
Matéria, corpo denso, corpo físico. Suporte material do espírito encarnado.  Meio de que ele dispõe para atuar na matéria.  Nele somatizam-se os impulsos positivos ou negativos oriundos dos demais corpos, em forma de vitalidade ou doenças, desajustes ou desarmonias. Nele também somatizam-se as impressões oriundas das personalizadas que vivemos encarnações  anteriores, que hoje se encontram latentes mas existentes em nosso animismo.

TEOSOFIA:
Divisão de acordo com os 7 Princípios do Homem
7

Âtmâ
Espiritual
6

Buddhi
5

Manas Superior (alma)
Mental
4
Princípios intimamente inter-relacionados durante a vida terrena, algumas vezes chamado Plano Psíquico superior
Manas Inferior (alma)
3
Kâma
Astral
2

Prâna – Duplo Etérico
Físico
1

Corpo Físico Denso


SKANDHAS:
Por: J. Viñas
Este ensinamento não deve causar surpresa ao estudante de Teosofia que pode associar os 5 skandhas com o mencionado em nossos livros como "o quaternário inferior" mais a porção encarnada de Manas. A diferença consiste em que a Doutrina Oculta descreve o ser humano como sendo constituído por sete elementos ou princípios. No Glossário Teosófico, encontramos informação relativamente ampla sobre a palavra skandhas , que reproduzimos incompleta aqui:

"SKANDHAS: Literalmente: "faces"ou grupo de atributos (...). Em todo ser vivo há cinco -esotericamente sete (...) :

1. forma (rupa) 2. percepção (vedana) 3. consciência (sañajña) 4. ação (sanskara) 5. conhecimento (vidyana)

Estes skandhas se juntam ao nascimento do homem e constituem sua personalidade. São os atributos (...) que depois da morte formam a base, por assim dizer, para uma nova encarnação kármica. Os skandhas são os germens da vida em todos os sete planos do ser e constituem a totalidade do homem subjetivo e objetivo. Cada vibração que produzimos é um skandha. (...) são os vínculos que atraem o Ego que se reencarna, os germens deixados para trás quando este Ego entra no Devachan e que haverão de ser recolhidos outra vez e esgotados por uma nova personalidade. Cada skandha lançado pelo homem há de voltar a ele, cedo ou tarde, posto que é sua própria vibração. Os skandhas são pensamentos encarnados, bons ou maus; permanecem cristalizados na Luz Astral e são atraídos à vida quando o que os originou volta à vida terrestre. Os skandhas se aderem e contagiam como uma doença e, por tanto, são perigosos tanto para si mesmo como para os demais."
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Renascimentos e Tipo de Skandhas:
Por: Prof.a. Dra. Eliane Moura Silva
Cada encarnação é um elo da roda dos renascimentos e mortes, sinal de um Atman que ainda não alcançou a sua Libertação e Imortalidade na absorção a Brahman, por estar preso, envolvido em condição carnal, aprisionado em vestes grosseiras da matéria densa e sutil. A existência encarnada na matéria é um aspecto provisório, acidental e frágil, sujeito tanto a deterioração e corrupção como aos caminhos do conhecimento e da libertação. O corpo físico morre, porém a verdadeira Vida do Espírito transcorre eterna, indestrutível.

Para chegar a esta essência doutrinária da impermanência e do papel da mente na construção desta percepção holográfica da “realidade”, surge uma inovação filosófica e doutrinária no Budismo: a concepção de que toda forma de existência no mundo está classificada em cinco categorias de “agregados” conhecidos como Skandhas. Esta concepção é definitiva pois traça a anatomia, a fisiologia, a mecânica de funcionamento dos pensamentos, sentimentos e suas relações com a vida, com a existência encarnada, a sua qualidade e relações com as futuras reencarnações.

Os Skandhas são agregações, aderências, conjuntos de elementos físicos, mentais, emocionais, espirituais interpenetrados que compõem e formam a percepção física e sensorial das coisas e também o estabelecimento das relações, de idéias, as associações entre formas, sentidos e a construção de projeções mentais objetivas e subjetivas. De forma bastante simples e resumida, os cinco Skandas são definidos da seguinte maneira:

1) Rupa-Kandha - É o agregado que distingue, a percepção física que permite distinguir coisas e sua natureza: material, vegetal, animal, humano, mineral, elemento, imagem ou qualquer outra coisa.

2) Vedana-Kandha - É o agregado de sensações desencadeadas pelo contato do objeto, tal qual é percebido e captado pelos orgãos dos sentidos. por ex., leve, pesado, quente, frio, duro, mole, liso, áspero, perfumado, nauseante, claro, escuro, doce, salgado, etc.

3) Sanna-Kandha - É o agregado da elaboração mental, o conhecimento obtido à partir do contato das percepções físicas e sensoriais produzidas pelos agregados anteriores. É o conjunto de elementos, de conhecimentos transmitidos ao campo mental pelo Rupa-Kandha e Vedana-Kandha, o que se apreende através das sensações. Por ex. “O fogo é quente, queima e dói.”  “Comida estragada é ruim e faz mal.” “Bebida alcoólica deixa tonto e faz mal.” Etc. É o princípio do que chamamos experiência acumulada. Há quem afirme que produz as sensações de prazer, dor, etc., desde que oriundas de fatores materiais, por ex. comida, sexo, carícias, machucaduras, etc.

4) Shankara-Kandha - É o agregado das associações mentais, das produções psíquicas. É dele que parte a imaginação com toda a gama de possibilidades. É onde realidade e suposição se mesclam podendo apresentar-se até com distorções. Há quem afirme que partem daqui os pensamentos, sentimentos de prazer ou sofrimento ligados a lembranças de situações, fatos, momentos, pessoas ou coisas, que podem ou não, ter ocorrido.

5) Vinnana-Kandha - É o agregado equibrador, harmonizador, organizador, integrador das sensações, dos sentimentos, das emoções, das experiências, da imaginação, das memórias dos vários Skandhas. Talvez por isto se atribua a ele também a capacidade de produzir prazer, dor, sofrimento ou qualquer outra forma de sentimento. É evidente que, pela sua capacidade de gerar pensamentos, deve sempre tentar conduzir e fazer prevalecer o impulso que lhe pareça mais proveitoso e agradável. Seria, também, neste caso, as formas de se proporcionar prazer a si próprio, resultantes da ação prevalecente deste agregado. Evita, ou minimiza, que a excessiva preponderância de qualquer dos outros agregados predomine sobre o conjunto desarmonizando a estrutura interior. Tenta dividir a carga de força e influência. Possibilita a aprendizagem e, possivelmente, a realimente. Desenvolve conceitos de lógica, abstração, etc. É como o cérebro e o coração funcionando harmoniosamente, de outra forma seria um verdadeiro caos. Daí pode-se ter ações devidamente equilibradas. 

Sendo os Skandhas corpos formados por agregação, não possuindo em si e por si consistência e materialidade, construções que produzem construções que produzem construções que produzem construções... Infinitamente...

É como se estivéssemos constantemente acumulando karma ao mesmo tempo em que o dissolvemos e o produzimos. Vida após vida tentando reverter esta situação, dissolvendo mais que produzindo. Se o conseguimos, gradativamente, a custa de grande esforço, vida após vida, chamamos a isto evolução, senão...

No Oriente  ensina-se que as voltas infinitas dos ciclos desta “Roda” podem ser paradas e a “Roda” extinta, dissolvida em si mesma. É isto que chamam  Nirvana, Nibbana, a Suprema Libertação, a Grande Extinção, que ocorre, também, em conjunto com o Samadhi, Satori, a Suprema Beatitude, o Divino Êxtase, a Suprema Fusão, a Perfeita Reabsorção em Deus, O Princípio Criador. Uma vez atingido tal  estado, todos os Skandhas são automaticamente dissolvidos, desintegrados, sendo a sua “matéria”, corpo de energia e estrutura energética, desfeitas e reincorporadas à massa da  “matéria” Cósmica Universal.
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A experiência do Self em William James e no Budismo:

Por: Mariana Tavares Ferreira
Universidade Estadual do Rio de Janeiro/UERJ e Universidade Estácio de Sá/UNESA

Pelo pensamento budista, configurando-se como o coração de sua prática.   Anatta, no páli, ou anatman,   em   sânscrito,   geralmente   traduzido   como   não-eu,  é  considerado  como  o conceito  diferenciador  do  Budismo  com  relação  aos  outros  sistemas  filosóficos  da  Índia. Uma  outra  tradução,  ao  nosso  ver  mais  adequada,  seria  a  de   ausência de substância inerente.

O  termo  skandhas   teria  sido  então,  um  subterfúgio  utilizado  pelo  Buda,  para explicar como “montamos” o nosso eu, já que ele é vazio de substância. Porém mais do que  explicações,  eram  ensinamentos  para  serem  refletidos  e  experimentados  através  de determinadas   técnicas   psicofísicas   inspiradas   no  Yoga,  que  nós  ocidentais  chamamos genericamente  de  meditação.  Como  no  método  introspectivo  jameseano,  trata-se de uma focalização  da  atenção  nos  próprios  processos  mentais  e  corporais  (que  no  budismo,  e no  pensamento  antigo  de  forma  geral,  não  se  encontram  separados).  Por  exemplo,  Buda propunha  que  se  prestasse  atenção  às  partes  do  corpo.  Que  é  o  corpo?  De  que  é  feita esta entidade aparentemente tão sólida e permanente?

Como se houvesse um saco com uma abertura em uma extremidade cheio de vários tipos de grãos, como arroz sequilho, arroz vermelho, feijões, ervilhas, milhete, e arroz branco, e um homem com vista boa o abrisse e examinasse: “Isto é arroz sequilho, arroz  vermelho,  feijões,  ervilhas,  milhete,  e  arroz  branco”;  da  mesma  forma,  um bhikkhu examina esse mesmo corpo... repleto de muitos tipos de impurezas: “Neste corpo existem cabelos... e urina”.   (SUTTA PITAKA, Majjhima Nikaya 10; 2004, sem paginação.)

Notem  que  “neste  corpo  existem  cabelos”,  que  caem  a  todo  momento...  e  “urina”, que  está  dentro  dele  mas  logo  estará,  se  tudo  correr  bem,  fora.  Uma  observação  atenta  do corpo  nos  dá,  portanto,  a  idéia  do  quão  impermanente  é  isso ao que atribuímos tanta solidez e unidade.

Skandha  quer  dizer  “amontoado”,  “coleção”  ou  “porção”.  Encontramos  também o  termo  agregados. Nos  textos  os  skandhas  são  descritos  separadamente,  mas  eles devem  ser  entendidos  como  um  único  movimento.  Tamanha  a  rapidez  com  que  se  dá,  o processo  escapa  a  nossa  percepção  comum.  Seriam  eles:  forma,  sensação,  percepção, formações   disposicionais e  consciências.   Como   o   Buda   teria   ensinado,   nem   “a consciência  é  o  eu”  e  nem  tampouco  “o  eu  é  possuído  de  consciência”,  sem que com isso  se  suponha  “a  consciência  como  estando  no  eu”  ou  o  “eu  como  estando  na consciência”.  (SUTTA  PITAKA,  Samyutta  Nikaya  XXII.93;

contato entre os “objetos” e os   “sentidos”, no próprio processo cognitivo, que emerge a consciência.  O  interessante  é  que  este  processo  não  é  meramente  perceptivo,  no  sentido passivo  que  costumamos  atribuir  ao  termo.  Envolve  também  a  ação  ou  certos  impulsos (percepção)  para  com  relação  ao  objeto  baseados  na   sensação  (agradável,  desagradável ou  neutra) e  também  a  formação  de  determinados  hábitos  ou  disposições  de  ação  para com  aquele  objeto.  É  exatamente  aqui  que  a  meditação  entraria,  buscando  criar  um intervalo  nesse  processo,  tomando  como  objeto  da  atenção  um  aspecto  aparentemente muito  simples:  a  própria  respiração.  Busca-se  assim  criar  um  espaço  de  liberdade  nesse ciclo   extremamente   rápido   e   impulsivo   de   ações   perceptivamente   guiadas,   para   que possamos agir de forma diferente, mais livre e criativa.

Buddha,  cuja  raíz  buddh  quer  dizer   despertar,  acordar  ou  iluminar  é  um  título, um   título   para   alguém   que   atingiu   a   outra   margem   da   existência   e   libertou-se   da ignorância  que  produz  o  sofrimento  humano.  Essa  questão  do  sofrimento  tem  dado ensejo  a  muita  interpretação  errônea  do  budismo,  como  uma  espécie  de  pessimismo, porque   para   nós   sofrimento   tem   fortes   conatações   psicológicas   negativas,   como angústia,  dor,  enfim,  sofrimento  aqui  não  tem  este  sentido.  Não  é  apenas  uma  questão humana,     psicológica:   é        uma    espécie         de      sofrimento     universal         decorrente    da transitoriedade  a  que  toda  a  existência  está  submetida.  Talvez  uma  melhor  tradução  seja insatisfatoriedade:   no   pragmatismo,   poderíamos   fazer   um   paralelo   com   o   estado   de dúvida  que  nos  impulsiona  para  outras  perquirições.  Portanto,  ele  não  tem  um  sentido estritamente  negativo.  Como  ensina  Leminski  (1987)  haveria  nas  línguas  indo-européias uma  palavra  que  significa  ser  objeto  de  uma  ação,  palavra  que  não  necessariamente  se associa a um sentido de dor, nem a um caráter depreciativo. Em grego, teríamos  o verbo
paskho, donde deriva passividade, paixão e padecer.

O interessante no budismo, ao contrário do que uma leitura apressada pode dar a entender,  é  que  não  é  exatamente  dessa  condição  transitória  que  decorre  nossa  dor, nossa  aflição.  Ela  decorre  de  uma  inabilidade  em  lidar  com  o  transitório,  de  uma  sede (tanha)  em  fixar-se  numa  forma  definitiva  ou  então,  de  buscar  refúgio  no  nada,  na negação  da  vida.  O  budismo  nos  aconselha  a  evitar  estes  extremos,  por  isso  ele  é conhecido   também   como   o   Caminho   do   Meio.   É   possível,   trilhar   um   caminho   de superação de nossa ignorância (avydia), e de fato, esse foi o maior legado de Buda, que, como Jesus Cristo, não deixou nada por escrito.

A   ignorância   que   devemos   superar   não   é   entretanto   algo   que   ainda   não saibamos,   mas   uma   ignorância   positiva,   por   assim   dizer:   trata-se  da  ignorância  que consiste  em  atribuir  aos  fenômenos,  principalmente  ao  nosso  self  um status  de solidez e substancialidade:  nosso  self   é  vazio  de  uma  substância  inerente.  Este  ensinamento  foi fortemente  enfatizado  no  Budismo  Mahayana,  constituindo-se  como  um  de  seus  pilares, através  da  noção  de  sunyata,  desenvolvida  pelo  filósofo  Nagarjuna,  que  viveu  cerca  de quatrocentos  anos  após  a  época  do  Buda  e  é  considerado  o  fundador  da  tradição Madhyamika (Caminho  do Meio).  Sunyata  geralmente  é  traduzido  como  vacuidade  ou não-substancialidade.  O  outro  pilar,  o  pólo  complementar  de  sunyata é  karuna  ou  a compaixão,  que  se  funda  não  num  sentimento  de  bondade  ou  piedade,  mas  na  própria experiência  de  não-substancialidade,  da  percepção  de  que  nada  é  em  si  mesmo,  mas apenas existe a partir das relações e da interdependência.

O   problema   do   sofrimento   relacionado   à   condição   temporal   da   experiência humana  não  é  exclusividade  do  Budismo,  várias  outras  filosofias  ou  darsanas  (pontos de  vista)  para  usar  a  terminologia  indiana,  procuraram  elaborar  vias  de  superação  desta condição. Por exemplo, a literatura das  Upanishad, que  começou a aparecer por volta de 800  a.  C.  e  foi  uma  primeira  “releitura”, digamos  assim,  da  antiga  tradição dos  Veda,  os mais antigos textos sagrados da Índia, defendia a idéia de que a superação da ignorância básica  do  ser  humano  seria  através  de  uma  relação  discípulo/mestre  (guru), na qual se busca  a  superação  das  categorias dualistas  do  pensamento  conceitual comum, de modo que  se  possa  vivenciar  a  identidade   entre  o  atman  (a essência) e brahman  (o substrato último  e  inexprimível  da  existência)  (GULMINI,  2002,  p.  30-1.)  No  entanto,  devemos ter  o  cuidado  de  não  equivaler  o  atman  ao  eu  pensante  da  psicologia  de  herança cartesiana,  uma  alma  ou  espírito  individual,  o  atman  é  mais  próximo  dos  sentidos  de psyche, o sopro vital que perpassa e anima todos os seres. Se não, vejamos:

O Eu habita todos os seres, ele está dentro de todos os seres; os seres, no entanto, não o conhecem; todos os seres são o seu corpo, ele os controla desde dentro. Ele não é visto, mas vê; não é ouvido, mas ouve; não é pensado, mas é o ‘pensador’ (manrt).  Ele  é  desconhecido  e,  contudo,  é  o  ‘conhecedor’  (...).  Ninguém  vê, exceto ele. Ele é o Eu, o Governante interior, o Imortal. (Brhadaranyakopanisad,
3.7, apud ZIMMER, 1991, p. 258.)

Já   os   ensinamentos   do   Buda  seria   considerados   como   “reformistas”   ou heterodoxos com relação à tradição dos Veda, isso porque o Buda irá discordar quanto à questão do  atman, “o eu que habita todos os seres”, propondo   a estratégia do  anatman. Vejamos as palavras atribuídas ao Buda no Discurso Curto do Rugido do Leão:

Embora certos contemplativos e brâmanes  reivindiquem apresentar a completa compreensão de todos os tipos  de apego...  eles  descrevem  apenas  a  completa compreensão  do  apego  a  prazeres  sensuais,  do  apego  a  idéias  e  do  apego  a preceitos  e  rituais  sem  descrever  a  completa  compreensão  do  apego  a  uma doutrina da existência de um eu.  (SUTTA PITAKA, Majjhima Nikaya 11; 2004, sem paginação.)

Através da leitura desta passagem, notemos que o Buda não Defende simplesmente a negação, o não-eu. Ele adota uma estratégia  pragmática,  procurando colocar  em  questão  doutrinas  metafísicas  e  verdades  preestabelecidas  em  prol  de  um incremento  da  experiência  humana. Sendo  assim,  uma  melhor  tradução  para  anatta  seria de fato  ausência de substância inerente, uma ausência que tem sua positividade e não é simplesmente   uma   negação,  o  não-eu. Uma ausência de substância que, como   no pragmatismo,  aponta para a dimensão da ação, onde tudo ainda está se fazendo, onde o que importa não é o ser ou o não ser, mas o vir-a-ser. A principal diferença com relação ao  pragmatismo  é  que,  mais  do  que  defender  um  pensamento  que  nos  incite  à  ação,  o budismo  é,  efetivamente,  uma  prática.  Para  saber  mais  sobre  ela,  propomos  que  se procure  o  mestre  mais  próximo,  ou  quem  sabe,  a  própria  vida.  Para  terminar,  uma história ou koan zen:

–Mestre, por favor, ensinai-me a verdadeira história do budismo.
Joshu respondeu-lhe:
–Terminaste a refeição?
–É claro, mestre, terminei.
–Então vai lavar suas tigelas! (DESHIMARU, p. 21, 1995.)
  
Referências Bibligráficas:
CALVINO, Italo. Seis Propostas para o Próximo Milênio . Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2001.
CAMPBELL, Joseph. As Máscaras de Deus. São Paulo: Palas Athena, 1994. COEN, Nissim. Dhammapada: a senda da virtude. São Paulo: Palas Athena, 2000.
DESHIMARU, Taisen. A tigela e o bastão: 120 contos zen. São Paulo: Pensamento, 1990. ELIADE, Mircea. Techniques du Yoga. Paris: Gallimard, 1948.
Mito do Eterno Retorno. São Paulo: Mercuryo, 1992.
Yoga: imortalidade e liberdade. São Paulo: Palas Athena, 1996.
FERREIRA, Aurélio B. de H. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
FERREIRA, Mariana. As Margens da Consciência: um estudo sobre o tema do self em William James e no Budismo. 2004. Dissertação. (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto de Medicina Social, Universidade do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade. Rio de Janeiro: Graal, 1998. v. 2. GLOSSÁRIO de termos Budistas em Pali. Disponível em:
<http://www.acessoaoinsight.net/glossario.html>. Acesso em: 11 fev. 2004.
GULMINI, Lilian. O Yogasutra, de Patañjali: tradução e análise da obra, à luz de seus fundamentos contextuais, intertextuais e lingüísticos. 2002. Dissertação (Mestrado em Filosofia, Letras e Ciências Humanas) - Pós-Graduação em Lingüística – Área de Semiótica e Lingüística Geral, Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível para download em: < http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde-03122003-163103/>. Acesso em: 11 fev.
2004.
HANSON, Karen. Pragmatism and the secret self. Cognitio - Revista de Filosofia. São Paulo, n.
2, p. 28-45, 2001.
HARVEY, Peter. An Introduction to Buddhism: teachings, history and practices. Cambridge: Cambridge University Press, 2000.
JAMES, Henry. A Fera na Selva. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.
JAMES, William.  A Filosofia de William James: seleção de suas principais obras. Tradução de
Antônio Ruas. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1943.

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