Abaixo, deixo um trecho do livro “Histórias do Povo de Umbanda”, psicografada por Edson Gomes. O trecho narrado é contado pelo Exu Serra Negra. Nele, Natan (Serra Negra), começa a aprender o que é ser um Exu de Lei. É instruído pelo Exu Pedra Negra. O diálogo acontece após uma série de acontecimentos onde, Natan, ainda não esclarecido, estava atuando como um kiumba:(Pág.134 e 135; Grifos nossos)
“_ Peste! _ Pedra Negra ergueu a voz _ Tu fez muita coisa ruim, e tá tendo chance de pagar e consertar. Eu já fiz muita coisa ruim, já paguei, já aprendi. Ele não é diferente. Tu não aprendeu nada com o sofrimento de ficar perdido? Tu não entendeu que só colheu aquilo que plantou até aqui? Se tu ainda não aprendeu nada disso ainda tem muito mais pela frente do que imagina.
_ Você também já foi assim?_ olhei para o meu próprio corpo deformado, enquanto perguntava.
_ Não! Eu aceitei logo de princípio. Nota: (aqui Exu Pedra Negra faz referência a aceitar auxílio após o desencarne, coisa que Natan não aceitou).
_ Então você é um espírito elevado! _ afirmei.
_ Não. Eu aceitei, mas isso não pagou o que eu fiz em Terra, não devolveu as vidas que eu tirei.
Olhei com raiva para ele.
_ Não, peste. Não sou melhor que tu por ter aceito primeiro. Já disse, isso não justifica o que fiz. É por isso que hoje aprendo a compensar o que eu fiz “trabalhando” para a elevação espiritual dos outros, como você. Essa é minha função. Eu guardo uma parte do umbral, não permitido que os mais baixos, os menos esclarecidos e os sem luz interfiram na vida dos justos e merecedores. Eu, peste, sou um guardião.Antes das Trevas invadirem a Luz, precisam passar por uma divisão, uma divisão com a mesma força das Trevas, mas que trabalha em nome da Luz. Eu faço parte dessa divisão. Zelo pelo material e por sua proteção. Isso é o que me distingue em Exu-de-Lei de um quiumba. É isso que me faz ser mais forte que você, e é assim que eu cresço rumo à luz. Fica fácil aprender, depois que tu aceita.
_ Você não dá tombo?
_ Não, já disse! Não trabalho pro que é baixo. Se eu fizer alguma coisa, vai ser pra ensinar, não pra derrubar. Não sou quiumba.
_ Você é bem pago?
_ Sou.
_ O que lhe entregam?
_ Nada. O que eu preciso, o que tu precisa, não tem entrega que possa pagar: vem apenas pelo trabalho.
_Então, tu não é bem pago! _ grunhi.
_Não quero ficar no buraco de onde acabei de te buscar. O que te ofereceram te tirou dele?
Fiquei calado. Senti-me pequeno, inútil.
Olhei para cima e vi planos espirituais, imitações de lugares na terra passando.
Nós já havíamos atravessado a camada mais baixa, onde apenas trevas e sombras se moviam, um lugar que chamam de “umbral”.
Entramos em uma penumbra, um lugar de caridade controlada, onde o ar sóbrio e calmo se espalhava. Ele me apontou um prédio alto, em estilo quase gótico, com altas torres e luzes enevoadas.
_Chegamos! Aqui você vai ficar para aprender, para se doutrinar e evoluir. Lá dentro é mais iluminado.
Fiquei olhando as janelas…seu padrão me recordava o Cabaret.
As sombras se alongando até se derreterem na parede oposta…, as velhas sombras das janelas do Cabaret. Assemelhava-se à familiaridade do Cabaret…”
PS: Esse excelente livro conta a história de três espíritos, integrados as falanges de Veludo, Serra Negra e Maria Padilha. Para quem quiser conhecer um pouco mais sobre Exu dentro da Lei de Umbanda, é um excelente livro. Acho interessante a maneira simples como Exu Pedra Negra explica o que é ser um Exu de Lei no trecho acima. Esse trecho retrata muito bem também, como os espíritos ligados a egrégora de Umbanda esclarecem os menos favorecidos, sem doutrina pesada, dogmas ou citações religiosas. Além da ênfase que se dá para o trabalho reconstrutor, ao invés do sofrimento descabido (muito naturais das doutrinas extremamente cristãs).
Fica a recomendação dos outros dois livros psicografados pelo autor: Mandinga e Rosário Pelourinho. Edson Gomes deveria ser mais conhecido no meio umbandista, seus livros são bem bacanas. A ele, e aos seus mentores espirituais, nossa homenagem…
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